Por Thiago T. Canossa
Com fundamento raso das poucas coisas que pude compreender até então, ou diga-se melhor, assimilar com mediano aprumo nesse breve átimo de experiência existencial, ouso afirmar que tudo começa, desenvolve-se e finda pela mente. Não é papo de guru. A realidade, princípio de tudo o que é tangível e potencialmente passível de se conhecer, é uma verdade que construímos a partir da qualidade dos nossos pensamentos. Para tanto, importa, acima de todas as coisas, que se alimente e mastigue adequadamente as informações que nos chegam e se processam pela mente.
O corpo humano é uma máquina incrível, dotada de incontáveis possibilidades ainda não reveladas integralmente pela ciência. Nesse intento, para uma melhor apreensão de conhecimento e conduta consequente, enquanto vivos, em prol da maximização do bem estar humano, julgo prioritariamente que busquemos compreender um pouco mais do funcionamento do cérebro, esse elementar computador, receptor que conduz e processa em sinapses cada uma das experiências vividas, processadas pelo músculo cinzento ao intermédio dos sentidos materiais aptos à apreensão das causas e consequente elaboração dos sentimentos, tão caros à manutenção de nossa subsistência.
Tal qual um processador mecânico, comum às tecnologias mais modernas tornadas imprescindíveis às facilidades contemporâneas, a mente trabalha por meio da linguagem. Explico: os conceitos que criam significados às coisas do mundo, abstratos ou concretos, correspondem a objetos imediatos, previamente catalogados por palavras que lhe dão nomes respectivos. Em cada novo contato, os objetos conhecidos e significados são conduzidos ao acervo dos conceitos já formulados pela mente do ser existente, e, submetidos a determinadas normas de linguagem natural, se lhe aderem para o desabrochar de novas imagens que virão a se transformar em ideias.
À guisa de exemplo, ao primeiro contato de uma criança com um termo então desconhecido, esse ser em princípio existencial incide em um esforço intelectual para estabelecer a conexão da palavra com o objeto que lhe é demonstrado pelos sentidos. Ao aprender a palavra “pai”, o cérebro do infante se esforça em elaborar um juízo intelectual que conecte a palavra à imagem do objeto que se concebe como tal. Para essa criança, “pai” é determinada coisa ou pessoa distinta das demais, com qualidades subjetivas de personalidade aliadas a uma imagem mental que lhe confira essa acepção.
Esse esforço intelectual de apreensão e interpretação das coisas do mundo, do nascimento com vida até a morte, é repetidamente aprimorado ao longo de nossa trajetória, tendo a mente por instrumento e a linguagem como veículo de significação. Afinal, nesse jogo todos empreendemos esforços grandiosos em busca de um sentido que nos mantenha, acima de tudo, coerentemente vivos.
No mesmo sentido, quando já adultos, esse princípio se mantém; todavia, com nuances específicas, adequadas ao tempo e à experiência individual de cada um. Cada fase da vida concluída se esbarra em novos desafios prioritariamente mentais, em que nos são exigidas novas elaborações de cunho significativo que nos guiem à fase seguinte. Um adolescente, quando já vencida a infância, se depara com novas pessoas, objetos, sentimentos e experiências em geral que lhe acarretam novas sinapses ao processamento das informações em seu contínuo desenvolvimento.
Já adulto, o jogo apresenta novas regras às fases subsequentes. São problemas de ordem social, política, familiar e funcional dificultando a manutenção de um sentido em construção, exigindo novas estratégias à elaboração dos novos conceitos que serão assimilados pelo cérebro, o que, de certa forma, restringe ou amplifica os caminhos mentais para cada desafio apresentado, gerando soluções ou retrocessos no âmbito do comportamento humano. Em grande parte, nessas fases, é comum que se busque ajuda em torno de outros referenciais de informação que preencham as lacunas inflamadas pela mente.
E assim, o idoso e o senil, sucessivamente. Embora traquejados, dependerão de outras estratégias e ferramentas intelectuais pela melhor elaboração do sentido da vida, que se transmuta largamente, sem as quais bem possível a superveniência de gravíssimas consequências de ordem mental.
A mente bem alimentada ilumina a consciência, produto da alma, fortemente influenciada pelas coisas nomeadas, apreendidas e processadas. As moléstias causadas pelo conflito das coisas indevidamente interpretadas podem levar às desistências perante novas condutas, ao regresso comportamental, ou mesmo à incoerência de sentidos, na forma de involução. Faz parte da caminhada. O suicídio, por sua vez, é o ato derradeiro de quem não vê saída, perdeu a crença no significado construído, por deixar de alimentar a busca por outros referentes que lhe adiassem as despedidas.
De forma geral, a ideia é tentar demonstrar ao caro leitor a relevância e o cuidado com as informações com as quais se tem contato, a fim de que se a transmute em relevante conhecimento prático, a partir do melhor uso possível da mente. Mas este, por si só, não basta. Conhecimento é mera informação interpretada, muitas vezes deixada de lado sem qualquer uso cotidiano.
Como na leitura de um artigo de jornal meramente informativo que noticia fatos sociais ao conhecimento do leitor. Nesse contato, um leitor aprimorado, utilizandose da consciência ora exposta, vai além, usa a informação a seu favor integralmente, de forma que a una ao conhecimento previamente adquirido e assimilado e lhe dê função prática, testada, sob erros e acertos, pra que finalmente, com o tempo, atinja a almejada SABEDORIA.
O mesmo ocorre ao contato com outros tipos de informações veiculadas. A literatura, enquanto arte com o uso da palavra, por exemplo, a muitos somente entretém. O leitor desavisado se encanta com o enredo de uma obra, afeiçoa-se aos personagens da trama proposta, a compreende e nada mais. Fica por isso mesmo, a ideia talvez nem mesmo seja debatida ou compartilhada em seu núcleo semântico essencial.
O leitor aprimorado se destaca, pois lendo, lento e atentamente, coloca-se no plano pelo autor criado, vislumbra um universo então desconhecido, no qual aprimora o seu vocabulário e conjuga cada nova informação em uma fórmula genérica e multidisciplinar apta a conduzi-lo a distintos conceitos e situações de vida que possam melhorar a qualidade de seus pensamentos, podendo mudar a rota de seu destino.
Assim também em um encontro, uma conversa, palestra ou discussão. São todas situações quais, em cuja interlocução, se bem aproveitadas à ocasião, com atenção, podem mudar as rotas das ideias velhas que nos levariam em queda livre ao chão.
Complexo? Não. Repita essa leitura quantas vezes necessário à fixação. Não digo que o decore, pois basta a compreensão limpa aliada à repetição. Tudo começa pela mente, tudo nela se fixa, diminui ou nos amplifica.
Alcançanda e posta em prática essa consciência, novos serão os olhares e outras serão as imagens que perfazem as cognições destinadas às situações mais corriqueiras da vida, as aparentemente simples podem ganhar a complexidade das cores e uma profunda harmonia. Tal qual um fotógrafo que traduz em imagens um recorte do tempo-espaço vivido, a riqueza das ideias capturadas em uma fotografia será mais sensível proporcionalmente à qualidade de seus referenciais e de tudo o que até então foi processado em sua mente. Fotografias são ideias óticas, prontamente aptas a serem interpretadas em palavras, gerando informação e conhecimento ao observador. Basta que o pratique.
Assim o poeta, que com pouca ocasião, na arte das palavras dedicadamente selecionadas, lavra em sua ata o que viveu e voluntariamente a transforma em desconstrução.
Creio nisso um ótimo ponto de partida para as mudanças tão almejadas em nossas vidas, mormente nos últimos séculos atribulados, em que as tarefas e necessidades em demasia nos tomam tempo à reflexão, subtraindo-nos o preciosismo de nossa própria construção.
O mundo é um texto obscuro e difícil em que vive mais e melhor quem busca compreendê-lo adequadamente, aprimorando rotineiramente os sentidos, sensibilizando-se ao que lhe chega aos olhos, boca, mãos e ouvidos. Só a mente pode nos mostrar a graça do infinito.
Por ignorância, ou por deixarmos de lado a relevância de nossos pensamentos, tornamo-nos cegos ao que vemos, aleijados das experiências simples às quais não nos detemos, porquanto não buscamos nas coisas os seus princípios. Fora da consciência, a depressão de uma demência, prematuros fins e mortes violentas.
Pense nisso.
Thiago Torres Canossa é servidor público estadual graduado em Letras pela Mackenzie, em São Paulo, e em Direito
**Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião deste veículo de comunicação