Agnaldo Jouse Denofre Ferreira foi condenado a 12 anos e 8 meses de prisão em processo por extorsão contra proprietários de um restaurante em Araçatuba (SP), que adquiriram um carro com ele e passaram a ser ameaçados devido ao atraso no pagamento das parcelas, de acordo com a denúncia do Ministério Público.
A pena refere-se a 9 anos e 4 meses referente ao crime de extorsão, mas ele também foi condenado a 1 ano de prisão por falsificação de documento particular e a 2 anos e 4 meses de reclusão por denunciação caluniosa.
Outros dois réus que trabalhariam com ele também foram denunciados e condenados de acordo com a denúncia por participação nos crimes de extorsão. Para Felipe de Azevedo a pena é de 11 anos, 3 meses e 13 dias de prisão e Fernando Henrique de Oliveira foi condenado a 10 anos, 1 mês e 27 dias de prisão.
Todos eles possuem antecedentes, de acordo com a sentença proferida pela 3.ª Vara Criminal de Araçatuba na última quarta-feira (30). O juiz autor da sentença determinou o regime fechado para início do cumprimento das penas, mas concedeu aos réus o direito de recorrer em liberdade. O Ministério Público ainda estuda se irá recorrer pleiteando o aumento das penas.
Denúncia
Segundo a denúncia, Agnaldo é sócio de uma locadora de veículos e frequentava o restaurante que posteriormente veio a ser alvo de disparos de arma de fogo, conforme matéria publicada em outubro de 2021. Em 2019 ele teria se apresentado a um dos proprietários do restaurante, como comerciante de veículos.
Ele negociou um Jeep Renegade zero-quilômetro, no valor R$ 72.000,00, recebendo em troca um Ford Fiesta. Ele teria vendido esse carro por R$ 10.000,00 e informou ao comprador que o restante do valor seria financiado por um banco indicado por ele, apresentando os documentos para a vítima assinar.
O comprador do Renegade também depositou R$ 14.000,00 na conta da locadora pertencente ao réu e recebeu o carro ainda sem as placas, sendo orientado fazer o emplacamento em nome da própria locadora.
Ao ser questionado, o vendedor teria alegado que se o negócio não fosse realizado dessa forma, o comprador perderia o valor já depositado e o Fiesta, que já havia sido vendido. Assim foi feito e a vítima recebeu um carnê com 57 parcelas R$ 2.223,00 para pagamento, emitidas em nome da locadora.
Pandemia
Com o início da pandemia em março de 2020, o movimento do restaurante caiu e após o atraso no pagamento de uma parcela, Agnaldo teria aplicado juros no valor de R$ 420,00 e determinado que a parcela atrasada seria acrescida ao final das demais.
A crise econômica se agravou e após outras duas parcelas não serem pagas, a vítima passou a ser ameaçada, assim como os demais familiares dela. Segundo a denúncia, em diversas ocasiões Agnaldo teria ido pessoalmente ao restaurante, demonstrando portar arma de fogo, para cobrar a dívida, com ameaças de morte.
Diante das ameaças, o valor foi renegociado e determinado o pagamento de 48 parcelas R$ 2.046,00, desta vez, destinado a outra empresa pertencente ao réu. Mesmo assim, as vítimas não conseguiram pagar e as ameaças foram intensificadas.
Devolução
Em dezembro de 2020, o outro réu, Felipe, teria ido ao restaurante para cobrar o pagamento e também teria feito ameaças. As vítimas procuraram Agnaldo, propuseram a devolução do Renegade, mas ele não teria aceito, alegando que não arcaria com os juros.
Diante das ameaças, a vítima entregou a Agnaldo um celular avaliado em R$ 4.000,00 e recebeu uma máquina de cartão, para passar as vendas do restaurante.
Ainda em dificuldade financeira, as vítimas propuseram transferir a própria casa para o nome de Agnaldo, mas desistiram após ele avaliar o imóvel em R$ 100.000,00, valor considerado abaixo ao de mercado. Além disso, ele teria condicionado o negócio ao pagamento das 48 parcelas de R$ 2.046,00, e não houve acordo.
Tiros
A partir de setembro de 2021, as ameaças se intensificaram, o carro teve o lacre da placa rompido no estacionamento de um supermercado, segundo as vítimas, e em 7 de outubro, Agnaldo e Fernando foram ao restaurante para buscar o Jeep, mas foram impedidos.
No mesmo dia, o dono da locadora retornou ao local acompanhado de outros dois homens e eles teriam tentado arrombar as portas de vidro. Durante a ação, Fernando teria feito menção a pegar uma arma de fogo e atirar na vítima.
Já na noite de 13 de outubro, uma pessoa não identificada, conduzindo uma moto de grande porte, fez vários disparos de arma de fogo contra o restaurante, danificando as portas de entrada do estabelecimento.
No dia seguinte, a vítima foi agredida com um chute no rosto por ocupantes de um carro que momentos antes, haviam sido flagrados filmando a fachada do restaurante.
Falsificação e denunciação caluniosa
Todos os fatos foram denunciados em boletim de ocorrência registrados na delegacia. Ao ser chamado para prestar esclarecimentos, Agnaldo alegou que havia alugado o Renegade e a vítima não teria quitado o valor referente à locação.
Segundo a denúncia, ele providenciou um contrato de locação do veículo com data retroativa e em 11 de novembro de 2021, esteve na delegacia para registrar um boletim de ocorrência de apropriação indébita.
Em 9 de dezembro ele registrou outra ocorrência, por calúnia e denunciação caluniosa contra a vítima, e foram instaurados inquéritos para investigar as denúncias. Além disso, em 25 de janeiro de 2022 foi ajuizada uma ação de reintegração de posse, com cobrança de aluguel contra a vítima.
Esta ação foi julgada improcedente e foi decretada a nulidade do contrato de locação do Renegade, conferindo a propriedade do veículo à vítima.
Condenados
Ao julgar o processo de extorção, a Justiça considerou que ficou comprovado que a relação comercial não era de locação de veículos, mas sim de compra e venda, e que houve as ameaças, inclusive com os disparos de arma de fogo que estilhaçaram as portas de vidro do restaurante.
“As ameaças foram executadas pelos réus Felipe e Fernando, a mando do réu Agnaldo, reforçando a robusta prova oral colhida nos autos. Quanto à extorsão, as provas são incontestáveis, no sentido de que ocorreram vários crimes, sempre em concurso de agentes, bastando lembrar dos depoimentos das vítimas e dos boletins de ocorrências existentes nos autos”, consta na decisão.
Foi desconsiderada a alegação da defesa de que se tratava de um contrato de locação do veículo, reforçando que foi julgada improcedente ação ajuizada por Agnaldo, decretando a nulidade do contrato de locação. “Assim sendo, Agnaldo concorreu para o crime de extorsão, na medida em que agiu como autor intelectual, deixando a execução a cargo dos corréus Felipe e Fernando”, cita a sentença.
Falsificação
Também foi comprovada falsificação do contrato de locação, supostamente assinado em 29 de outubro de 2019, já constando a placa do veículo, apesar de as taxas administrativas para emplacamento terem sido pagas apenas em 12 de novembro, demonstrando que o contrato foi feito com data retroativa.
“Como se vê, a prova é segura para afirmar o dolo com que agiu o acusado, ao falsear a assinatura da vítima, lembrando que qualquer prejuízo decorrente do ato praticado pelo acusado é mero exaurimento do crime. Em outros termos, não se exige, para o caso, a efetiva lesão, mas tão-somente a potencialidade lesiva, que restou comprovada nos autos", consta na sentença.
Para a Justiça, também ficou configurado o crime de denunciação caluniosa, devido ao réu ter denunciado a vítima pelos crimes de apropriação indébita, denunciação caluniosa e calúnia, cujos inquéritos foram arquivados. “Importante anotar que, em ambos os casos, houve instauração de inquérito policial, então o crime se consumou, em que pese não ter ocorrido o indiciamento ou oferecimento da denúncia”.
Regime fechado
Ao decidir pelo regime fechado para o início do cumprimento da pena, a Justiça levou em consideração que a extorsão é crime grave, que revela temibilidade do agente: “E ele que vem gerando o clima de violência e de intranquilidade que aflige a sociedade brasileira atual, estando a exigir medidas eficazes para combatê-lo”.
Também pesou os maus antecedentes dos réus, que são reincidentes, mas poderão recorrer em liberdade. A reportagem tenta contato com as defesas para comentar sobre a decisão e eventual recurso.