Opinião

O mistério da Câmara de Araçatuba

"... a Câmara de Araçatuba deve ser um dos poucos lugares no mundo onde o funcionário ganha mais do que o “patrão” e o “patrão” ainda briga para pagar mais"
Lázaro Jr.
19/12/2023 às 21h33

Por Lázaro Jr.


Poderia ser nome de um filme, que no caso, seria de terror, mas não é! Qual será o mistério da Câmara Municipal de Araçatuba? Nesta segunda-feira (18), às 9h, horário nada habitual, por maioria de votos, vereadores desprezaram o apelo popular e desafiaram a Justiça para aprovar aumento nos salários dos assessores parlamentares e chefes de gabinete dos vereadores, que passarão a receber entre R$ 16 mil e R$ 18,5 mil mensais. Esse reajuste havia sido suspenso por meio de liminar concedida na semana passada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em ação da Procuradoria Geral de Justiça.

 

O que chama a atenção é a forma com que parte dos vereadores, principalmente os integrantes da Mesa Diretora, grande maioria em sua primeira legislatura, defendem o aumento. E essa atitude chama ainda mais a atenção porque a Câmara de Araçatuba deve ser um dos poucos lugares no mundo onde o funcionário (assessor) ganha mais do que o “patrão” e o “patrão” ainda briga para pagar mais.

 

Mais estranho ainda é que esse patrão, no caso o vereador em Araçatuba, não tem essa disposição de enfrentar a população, quando é para reajustar o próprio subsídio, que é o nome dado ao salário recebido mensalmente pelos próprios vereadores. 

 

Somente neste ano foram duas tentativas de se reajustar o subsídio dos vereadores, a primeira também em uma sessão extraordinária, em janeiro, e a segunda em novembro. Na primeira vez a Mesa Diretora recuou e engavetou o projeto, momentos antes da discussão, com a Casa cheia. Na segunda vez, confesso que imaginei que o projeto fosse aprovado. A proposta era elevar o subsídio mensal para R$ 9,8 mil.

 

A Câmara de Birigui já havia aprovado o reajuste, semanas antes, e a partir de 2025, os 15 vereadores da cidade vizinha passarão a receber R$ 10,8 mil mensais. O mesmo aconteceu com Penápolis, que aprovou um reajuste escalonado. Assim, em 2025 os vereadores daquela cidade receberão R$ 6,5 mil por mês, valor que subirá ano a ano, até chegar a R$ 7,8 mil a partir de janeiro de 2028.

 

Porém, em Araçatuba, o projeto mais uma vez foi engavetado pela Mesa Diretora e os vereadores continuarão recebendo pouco mais de R$ 6,5 mil, que curiosamente representa só um terço do que foi aprovado para um chefe de gabinete, que presta serviço para o vereador e vai ganhar R$ 18,5 mil por mês e ainda teve esse reajuste defendido por "unhas e dentes".

 

Na sessão desta segunda-feira teve vereador que saiu da cadeira reservada a ele e foi “bater boca” com um cidadão/eleitor, que estava contestando o reajuste. Outro alegou que o valor pago aos assessores é “razoável” diante do serviço prestado e disse que não seria uma minoria (meia dúzia, nas palavras dele), que o faria mudar o voto. E ao término da votação, ele ainda zombou dos presentes, ao obter resultado favorável.

 

Essas atitudes demonstam bem o que foi o desrespeito aos eleitores e população em geral ocorrido nesta segunda-feira, principalmente aos que compareceram à Câmara de Araçatuba para fazer aquilo que seria a função do próprio vereador, que é fiscalizar o gasto do dinheiro público. Porém, alguns dos que ali estavam deixam claro que consideram estar fazendo um favor para a população ao sentar na cadeira.

 

Não estão! Cada um dos 15 vereadores se propõs a estar ali, se colocou candidato para representar a população, sabendo qual seria a remuneração recebida, quantos assessores teria e quanto cada um de seus assessores receberia. E se fosse tão ruim assim, não haveria tantos que estão na Casa há tanto tempo.

 

E no próximo ano haverá eleições municipais. Quem for candidato já sabe que a remuneração que receberá pelos quatro anos seguintes será a de hoje, que é pouco mais de R$ 6,5 mil. Isso porque, a legislação não permite que os vereadores aprovem reajuste no próprio subsídio. Assim, os vereadores eleitos só poderão aumentar os subsídios daqueles que irão sucedê-los, a partir de 2029. É esperar para ver quantos desses que hoje consideram o subsídio baixo irão concorrer a mais uma legislatura.

 

Ainda há espectativa de que a Justiça tome alguma providência quanto ao aumento aprovado nesta segunda-feira. O Ministério Público já pediu informações à Câmara sobre o projeto e aos vereadores sobre como cada um votou, para analisar se há alguma infração legal, já que havia decisão judicial impedindo esse aumento. Se houver ilegalidade, que os responsáveis sejam julgados e penalizados. Quem sabe assim acabe o mistério da Câmara de Araçatuba.

 

Lázaro Jr. é jornalista residente em Araçatuba há mais de 10 anos

 

** Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião deste veículo de comunicação

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