Justiça & Cidadania

Justiça Federal de Bauru absolve 10 réus acusados de fraudar auxílio emergencial

Juiz considerou ilícita a entrada dos policiais na chácara onde houve o flagrante; 6 deles foram condenados pelo mesmo crime pela Justiça Federal de Araçatuba
Lázaro Jr.
10/02/2024 às 15h20

A Justiça Federal de Bauru (SP) decidiu absolver por falta de prova, dez réus denunciados por fraudar o auxílio emergencial do governo federal concedido durante a pandemia da covid-19. A maioria deles foi presa em flagrante em uma chácara em Lençóis Paulista, pela Polícia Militar.

 

Dos dez réus, cinco já haviam sido condenados pela Justiça Federal de Araçatuba pelo mesmo crime, um deles em sentença proferida nesta semana, relacionada à Operação Vida Fácil. Os outros, em maio de 2023.

 

No caso de Bauru, o processo é referente a uma prisão flagrante ocorrida em agosto de 2020, em uma chácara em Lençóis Paulista. E foi justamente por considerar o flagrante irregular que a Justiça decidiu pela absolvição. Porém, determinou o perdimento dos bens e do dinheiro bloqueado nas contas dos investigados, que podem recorrer da decisão.

 

Flagrante

 

Conforme publicado na ocasião, na noite de 11 de agosto de 2020, equipe do Baep (Batalhão de Ações Especiais de Polícia) da Polícia Militar de Bauru prendeu nove pessoas, entre elas, duas mulheres, sendo a maioria de Araçatuba e Birigui.

 

O grupo estava em uma chácara alugada em Lençóis Paulista, onde foram apreendidos mais de R$ 60 mil em dinheiro, cheques, celulares, chips, cartões bancários e carros de luxo. Na ocasião a polícia informou que chegou à propriedade após denúncia de movimentação suspeita no local, onde havia alguns veículos de luxo.

 

Os policiais relataram que teriam abordado dois ocupantes de uma caminhonete que chegavam no local, que teriam autorizado a entrada no imóvel, onde estavam os demais integrantes do grupo.

 

Na casa havia uma estação de trabalho, com seis pessoas operando computadores, utilizando números de CPF de pessoas que não estavam no local, materiais que seriam utilizados para o recebimento indevido de valores do auxílio emergencial do governo federal.

 

Denúncia

 

Na sentença, proferida na sexta-feira (9) pelo juiz Marcelo Freiberger Zandavali, da 2ª Vara Federal de Bauru, consta que a denúncia foi recebida em 21 de setembro de 2020. Nela consta que os denunciados "promoveram, constituíram ou integraram, pessoalmente, organização criminosa estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com o objetivo de obter vantagem ilícita, mediante a prática de fraudes, consistente no recebimento indevido de vários Auxílios Emergenciais, benefício financeiro concedido pelo governo federal em virtude da pandemia de covid-19”.

 

Cita ainda que “no mesmo período, os denunciados, por meio de organização criminosa, voluntária e conscientemente, obtiveram, para si ou para outrem, vantagem indevida, consistente em vários auxílios emergenciais, benefício financeiro concedido pelo Governo Federal em virtude da pandemia de Covid-19, em prejuízo alheio, ao induzir e manter em erro, mediante fraude, particulares e entidade de direito público (União representada pela Caixa Econômica Federal), incorrendo, assim, na prática do crime de estelionato majorado”.

 

Sem flagrante

 

Ao julgar o caso, o juiz considerou com base nos depoimentos dos réus e testemunhas, que não havia flagrante, no momento imediatamente anterior à entrada na chácara, “apenas meras suspeitas, em razão de carros de grande porte estarem no local”.

 

Ele cita na decisão que no dia 30 de julho daquele ano, criminosos assaltaram a agência do Banco do Brasil, em Botucatu, em ação de grande periculosidade, e isso teria motivado a diligência da Polícia Militar na chácara.

 

“De todo duvidosa a afirmação de que os acusados teriam autorizado o ingresso, voluntariamente, ainda mais quando sabiam da atividade criminosa em curso. Em juízo, ambos os acusados negam terem consentido com o ingresso da PM”, consta na decisão. 

 

O juiz entendeu ainda que mesmo que houvesse a suposta autorização, a voluntariedade do ato estaria de todo comprometida, pois estavam os acusados sozinhos, à noite, e diante de dois pelotões do Batalhão de Operações Especiais de Polícia, com 40 homens em dez viaturas. “Releva destacar que, a rigor, nem mesmo as referidas testemunhas da acusação tiveram conhecimento da autorização”. 

 

Além disso, a caseira da propriedade relatou que também não autorizou o ingresso da polícia. “Não há registro, portanto, da autorização válida de ingresso, ônus que recai sobre os agentes do Estado. Assim, toma-se por ilícita a entrada dos policiais na chácara em que estavam hospedados os réus, o que contamina toda a prova coligida pela acusação”, decidiu o juiz.

 

Perda dos bens

 

Porém, apesar de reconhecer que a nulidade das provas impeça a condenação, o magistrado entendeu que deve ser considerada lícita a situação de flagrante de estelionato identificada pela prova pericial e pela própria confissão dos acusados. “Assim, há que se decretar a perda dos instrumentos e do produto dos crimes”, consta na decisão.

 

Foi decretado o perdimento de R$ 60.831,00 em dinheiro encontrados no local; de 26 celulares; dos valores bloqueados em contas dos denunciados, os quais não foram informados; das cadeiras "Gamer"; dos notebooks e equipamentos de informática; dos 980 chips de telefonia celular, cheques e cartões bancários; dos computadores e outros insumos de informática; e dos veículos Evoque, S-10 e Cruze.

 

Absolvidos

 

Dos dez réus absolvidos pela Justiça Federal de Bauru, cinco haviam sido condenados pela Justiça Federal de Araçatuba. Anderson Portela de Barros Azevedo, que é de Lençóis Paulista, pegou 19 anos, 9 meses e 6 dias de prisão, em sentença proferida pela Justiça Federal de Araçatuba na última quarta-feira (7).

 

Esse processo é referente à Operação Vida Fácil, que segundo a Polícia Federal, a investigação teve início após comunicação do Banco Nacional de Fraudes ao Auxílio Emergencial e informação dada por colaborador anônimo. No caso de Bauru, os crimes teriam ocorrido entre meados de julho e agosto de 2020, enquanto em Araçatuba teriam sido praticados entre 28 de maio de 2020 e setembro de 2021.

 

Outros cinco absolvidos no processo que tramitou em Bauru foram condenados a 21 anos e 4 meses de prisão cada um, em regime inicial fechado, pela Justiça Federal de Araçatuba proferida em maio de 2023. São eles: Bruno Aparecido de Oliveira (de Maringá), Bruno Mariano Baggio (de Birigui), Flávio Adauto Portela de Barros (de Lençóis Paulista), Wesley dos Santos Carvalho (de Birigui) e Jonathan Aparecido de Oliveira (de Maringá).

 

Os demais absolvidos são Gabriela Ribeiro de Almeida, Ariadne Cristina Sampaio Ribeiro, Beatriz Pereira Borges e Paulo Henrique Araujo Vital.

 

Defesas

 

A reportagem procurou a equipe do advogado Elber Carvalho de Souza, que representou os réus Paulo Henrique Araujo Vital e Bruno Mariano Baggio, para comentar a decisão, mas foi informada que ele está em Brasília (DF) a trabalho.

 

As defesas dos demais réus foi feita pelos advogados Milton Walsinir de Lima e Nathaly Fernanda de Lima, do escritório Lima & Lima Advogados. Para Milton, o juiz autor da sentença agiu com o devido rigor do que preconiza o ordenamento jurídico brasileiro, pois ele considera que houve patente violação a dois preceitos constitucionais: a inviolabilidade do lar e o direito ao silêncio.

 

Segundo o advogado, existe um conflito de competência com relação à ação que tramitou na Justiça de Bauru e a que tramitou em Araçatuba, pois os R$ 10 milhões que seriam o suposto prejuízo causado pelo grupo, não se resumiria apenas a estes episódios, pois seriam a nível nacional, ocorridos durante a vigência do benefício.

 

“Urge ainda consignar que não resta comprovado nos autos, qual seria o prejuízo suportado pela Caixa Econômica Federal. Observa-se nas presentes ações penais, que não há qualquer comprovação que houve por parte da Instituição Financeira Pública, comprovação que ressarciu as suposta vítimas, o que forçosamente impõe a redistribuição dos autos e assim, encaminhamento para a devida competência da Justiça Comum”, justifica.

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