Justiça & Cidadania

Justiça dá 6 meses para Estado realizar procedimentos ortopédicos em pacientes que aguardam na fila

Segundo a Santa Casa de Araçatuba, a lista de espera em agosto era de 1.705 pacientes, sendo 832 cirurgias de média e 873 de alta complexidade
Lázaro Jr.
03/09/2024 às 19h39

A Vara da Fazenda Pública de Araçatuba (SP) condenou o Estado a tomar as providências necessárias para atender os pacientes que aguardam atendimento ortopédico há mais de 6 meses na Santa Casa local, que é o hospital conveniado para esse tipo de atendimento para os 40 municípios da área de abrangência do DRS-2 (Departamento Regional de Saúde).

 

Pela decisão, proferida no dia 21 de agosto pelo juiz Danilo Brait, será aplicada multa diária de R$ 300,00, até o limite de R$ 300.000,00, em caso de descumprimento da decisão. Estão incluídos nessa relação consultas, exames e cirurgias que devem ser realizados no prazo de 6 meses.

 

De acordo com a Santa Casa, em agosto havia 1.705 pacientes na fila, contando apenas aqueles com laudos, que é a indicação médica oficializada, à espera procedimentos de ortopedia. São 832 cirurgias de média complexidade e 873 de alta complexidade.

 

Ação

 

A ação foi movida pela Promotoria de Justiça de Araçatuba em abril deste ano, com base em inquérito civil foi instaurado em fevereiro de 2019, pelo promotor de Justiça Cláudio Rogério Ferreira. Nela consta que durante atendimento na Promotoria de Justiça foi constatado que havia uma grande quantidade de pacientes aguardando cirurgias de ortopedia, com fila de espera superior a três anos e estaria aumentando.

 

Naquele ano, a Santa Casa de Araçatuba informou que dispunha de equipe médica da especialidade de ortopedia composta por oito médicos e que em 2018 haviam sido realizadas 1.430 cirurgias de ortopedia. Ainda de acordo com o hospital, a lista de espera para atendimentos eletivos era consequência dos atendimentos emergenciais.

 

A Santa Casa rgumentou ainda que atenderia mais de 40 municípios e que o serviço de ortopedia da instituição seria considerado de qualidade, com atendimentos em percentual acima do pactuado no Convênio com o SUS (Sistema Único de Saúde).

 

Convênio

 

Já o DRS-2 (Departamento Regional de Saúde) informou que foram realizadas 144 cirurgias em 2018 pelo convênio mantido com a Santa Casa de Araçatuba para realização de cirurgias na área de ortopedia. Argumentou ainda que a lista de espera seria responsabilidade do prestador do serviço.

 

Como em março de 2020 a Santa Casa foi classificada como hospital de referência regional para a pandemia da covid-19, as cirurgias eletivas foram suspensas. Só em novembro de 2021 a Santa Casa informou a retomada da realização das cirurgias eletivas, que estavam sendo realizadas conforme disponibilidade de leitos para internação, entre UTI´s (Unidades de Terapia Intensiva) e enfermarias.

 

O hospital informou ainda que havia dado início ao mutirão de cirurgias ortopédicas de alta complexidade nas especialidades de quadril e joelho, atendendo a demanda reprimida interna.

 

Fila

 

No último ofício de acompanhamento enviado pelo hospital ao Ministério Público, em 14 de dezembro de 2023, foi informado que havia 604 procedimentos cirúrgicos ortopédicos aguardando a realização, 25 deles de caráter eletivo.

 

Depois disso, o MP passou a monitorar informações de que a Santa Casa aceleraria as cirurgias por meio de programas do governo do Estado, o que não se concretizou. Foi constatado ainda que havia pacientes aguardando há mais de um ano pelo procedimento ortopédico, sem qualquer previsão de concretização.

 

Contestação

 

Ao ser intimado da ação, o Estado pediu que o município fosse incluído no polo passivo da demanda, sob argumento de que trata-se de obrigação solidária entre os entes públicos. Além disso, alegou ausência de omissão que justifique a intervenção do Poder Judiciário.

 

O Estado justificou que os procedimentos na área de ortopedia estariam sendo realizados a contento e que a simples contratação de mais médicos seria solução simplista, por existir toda uma estrutura para que os procedimentos sejam realizados.

 

Por fim, argumentou que não existe prazo para o atendimento de procedimentos ortopédicos eletivos e seria impossível a intervenção judicial no mérito das políticas públicas.

 

Omissão

 

Ao julgar a ação, o juiz indefiriu o pedido para incluir a Prefeitura de Araçatuba no polo passivo da ação e justificou a necessidade de intervenção do Judiciário. Para o juiz, os fatos apontados pelo Ministério Público apontam para patente omissão do Estado na política pública de atendimento aos cidadãos que necessitam de atendimento na área de ortopedia.

 

"O longo tempo de espera noticiado se mostra incompatível com o princípio constitucional da eficiência no serviço público, bem como faz tábula rasa aos comandos constitucionais citados. E a omissão verificada autoriza este juízo a adentrar em esfera que seria de competência administrativa dos entes federados, sob pena de se permitir o descumprimento pelo Estado (sentido amplo) de mandamento constitucional garantidor de direito fundamental do cidadão", justifica.

 

O magistrado argumenta que quando se trata de serviço público essencial, o cumprimento de políticas públicas para que seja dado efetivo cumprimento ao serviço merece intervenção do Poder Judiciário, quando devidamente provocado.

 

Demora

 

Ele cita na sentença que quando a ação foi movida, havia pacientes aguardando na lista de espera desde 2017. "E com o número expressivo de pacientes aguardando consulta, não se sabe quantos são os que necessitam de cirurgias, o que impõe e mais se justifica o rápido atendimento", cita.

 


Na decisão o magistrado reconhece os esforços apresentados na contestação, mas considerou as medidas claramente insuficientes. "A título de ilustração, no dia a dia da presente Vara são constantes os pedidos de cirurgias, medicamentos e tratamentos em geral, cuja precariedade no oferecimento da saúde neste município e na região, é de notória omissão por parte do Estado de São Paulo".

 

Por fim, consta na sentença que eventual repartição de competências deve ser resolvido posteriormente, por meio de ressarcimentos e compensações. O juiz justificou que não foi juntada na ação nenhuma prova de que a prestação do serviço seria de responsabilidade de outra entidade estatal.

 

"Aliás, se o repasse de verbas financeiras discrepa da repartição de atuações no âmbito da saúde, como sempre alegam, seria o caso de os dirigentes políticos de cada esfera de governo se acertarem, por meio de fundos de compensações". E acrescenta: "É preciso que a saúde, direito fundamental, seja vista com maior atenção".

 

Providências

 

O juiz negou o pedido para determinar a contratação de médico, por considerar cabe à administração pública analisar a conveniência e oportunidade na contratação. Porém, considerou que é possível determinar que o Estado adote providências necessárias para atender aos cidadãos que aguardam atendimento ortopédico, fixando-se prazo razoável para cumprimento da decisão.

 

"Também convém observar que não se pode querer impor à atual gestão a total responsabilidade pelo descaso que se prolonga no tempo por inércia de gestores anteriores, não podendo ser vista a intervenção judicial como a panaceia de todos os problemas de natureza acentuadamente administrativa", finaliza.

 

Estado

 

Procurado pela reportagem, a PGE (Procuradoria Geral do Estado) informa que ainda não havia sido intimada da decisão. O órgão cita ainda que atualmente as filas de espera para exames, atendimentos, cirurgias e procedimentos é descentralizada, mas a atual gestão trabalha para identificá-las e unificá-las.

 

"A SES (Secretaria de Estado da Saúde) reforça o compromisso da atual gestão em ampliar o acesso da população aos serviços de saúde, além de elevar a qualidade do atendimento e reduzir o tempo de espera na fila por meio da Tabela SUS Paulista, uma iniciativa inédita que remunera em até cinco vezes mais pela realização de procedimentos médicos realizados pelo SUS", informa a nota.

 

Por fim, informa que de janeiro a junho deste ano, foram repassados R$ 40 milhões para a região de Araçatuba.

 

Santa Casa

 

A Santa Casa de Araçatuba informa que aguardará a comunicação oficial e instruções da Secretaria Estadual de Saúde, por meio do DRS-2, em relação ao cumprimento da sentença.

 

O hospital acrescenta que é prestador de serviços SUS de média complexidade para quatro municípios (Araçatuba, Santo Antônio do Aracanguá, Nova Luzitânia e Bento de Abreu) e de alta complexidade para 40 munícios da região.

Entre no grupo do Whatsapp
Logo Trio Copyright © 2024 Trio Agência de Notícias. Todos os direitos reservados.