Justiça & Cidadania

Juíza considerou ‘absolutamente grosseira’ a alegada adulteração de placa que resultou na cassação de Maffeis

Ao conceder a liminar determinando o retorno imediato do prefeito, ela justificou que a primeira-dama fez uso do veículo com as placas oficiais em caráter excepcional
Lázaro Jr.
24/04/2024 às 18h46
Carro particular estava com placa oficial da Prefeitura de Birigui (Foto: Divulgação) Carro particular estava com placa oficial da Prefeitura de Birigui (Foto: Divulgação)

“Quanto à ilicitude na conduta do autor, pontuo que a alegada adulteração, mencionada pela parte ré, é absolutamente grosseira, incapaz de enganar o ‘homem médio’ ou como dito mais modernamente, ‘a pessoa humana natural’”.

 

Esse foi um dos argumentos utilizados pela juíza da 1ª Vara Cível de Birigui, Íris Daiani Paganini dos Santos Salvador, ao conceder liminar nesta quarta-feira (24), determinando o retorno imediato do prefeito Leandro Maffeis (Republicanos) ao cargo.

 

Ele teve o mandato cassado na última segunda-feira (22), após a aprovação do relatório da CP (Comissão Processante) que investigou o uso de placas oficiais do município por carro particular do prefeito. Na tarde do dia 30 de janeiro, o veículo, um Toyota Corolla, foi encontrado estacionado na frente da Secretaria Municipal de Assistência Social, local de trabalho da então primeira-dama.

 

O Hojemais Araçatuba foi o primeiro veículo de imprensa a divulgar os fatos, após tomar conhecimento no mesmo dia. Entretanto, a publicação foi feita apenas no dia 5 de fevereiro, após acesso ao registro feito pelos guardas municipais que estiveram no local, acionados pelo vereador André Fermino (PP), após denúncia recebida por ele.

 

Porta-malas

 

Conforme relatado pelos guardas municipais, ao vistoriar o veículo eles encontraram as placas originais dentro do porta-malas. Elas são do Mercosul, tipo que não exigem lacre, por isso, podem ser retiradas a qualquer momento. O carro estava com as placas de número 002.

 

Ao ser questionada, a primeira-dama alegou que o veículo oficial da Prefeitura, que utiliza as placas 001, estaria em manutenção. Como Maffeis precisava ir para São Paulo no dia anterior, ele teria utilizado o carro particular que estava com ela e instalado por conta própria, a placa 002 no carro particular, para facilitar o acesso às repartições públicas na Capital.

 

O prefeito teria retornado a Birigui no mesmo dia, assim, ela teria pego o carro apenas para ir para o trabalho na secretaria, ainda com as placas oficiais, onde foi procurada pelos guardas municipais. Devido ao carro estar estacionado, os agentes apenas orientaram que as placas originais fossem reinstaladas.

 

Ausência de justa causa

 

A juíza que analisou o pedido da defesa de Maffeis para suspensão do decreto legislativo que cassou o mandato do prefeito, citou na decisão que houve “aparente ausência de justa causa e ilícito nos fatos que culminaram com a cassação”.

 

“O conjunto probatório produzido não traz, em sede de cognição sumária, a confirmação de que o quadro fático narrado tenha de fato sido caso claro de improbidade administrativa, não havendo prova de dolo na conduta do chefe do executivo”, cita no despacho.

 

Ela acrescenta que os documentos apresentados não indicam que houve, em princípio, infração a qualquer dos tipos descritos em decreto que indica possibilidades de enquadramento em infrações político-administrativas dos Prefeitos Municipais, que serão julgadas pela Câmara de Vereadores, sancionáveis com cassação.

 

Consta na decisão que a denúncia contra Maffeis foi fundamentada no art. 4º, incisos VII, VIII e X do DL nº 201/67 deste decreto: "Praticar, contra expressa disposição de lei, ato de sua competência ou omitir-se na sua prática; Omitir-se ou negligenciar na defesa de bens, rendas, direitos ou interesses do Município sujeito à administração da Prefeitura; Proceder de modo incompatível com a dignidade e o decoro do cargo".

 

Banalização

 

No entendimento da juíza, o ato político-administrativo deve obedecer aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sob pena de se transformar em salvo-conduto para arbitrariedade e abusos do poder político. E acrescenta ser triste a banalização e vulgarização de processos políticos-administrativos, que apenas devem ser utilizados na existência de real ato de improbidade, corrupção e arbitrariedade, o que não ocorreria nesse caso.

 

Ele acatou os argumentos da defesa, que alegou que Maffeis fez uso de carro particular com placas oficiais do município para cumprir função político-administrativa, em visita à Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento.

 

Acrescentou que ele teria pago todas as despesas com recursos próprios, sem qualquer utilização das placas (ou mesmo do veículo) para fins particulares ou adversos às funções políticas e administrativas atinentes aos cargos de Chefe do Poder Executivo, ou utilização de recursos públicos junto ao veículo supracitado.

 

“Do mesmo modo houve utilização do veículo, no dia seguinte à viagem, em caráter excepcional e durante o expediente oficial, pela primeira-dama, na condição de Secretária Municipal de Assistência Social, para despachar junto ao respectivo setor”, justifica.

 

Denúncia

 

A magistrada também argumenta que as placas oficiais no carro particular teriam sido vistas por pessoa comum, que relatou o fato ao vereador, que fez a denúncia à Câmara. “... o autor (prefeito), em momento algum, tentou esconder, narrando, inclusive, que no dia anterior, 29/01/2024, para cumprimento de agenda de interesse Municipal na Capital Paulista, em especial frente à Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento, em função política e administrativa, utilizou seu veículo particular com placas do veículo oficial em viagem”, cita.

 

Segundo a juíza, seria inadequada a rotulação criminosa na conduta do prefeito, que não teria causado qualquer mal à sociedade ou obtido proveito próprio. “... sensata a consideração de aparente conduta materialmente atípica, sem ofensividade relevante a bens jurídico-penais sob a égide do garantismo indissociável do Estado Democrático de Direito”, descreve.

 

Riscos

 

Por fim, a autora da liminar considerou que a demora em uma decisão poderia trazer prejuízos ao município e à população, que enfrentaria turbulência no comando das atividades fundamentais ao bem público. “A demora, portanto, se consubstancia no interesse público e na administração municipal seguir seu curso da forma menos prejudicial possível à sociedade”. 

 

A magistrada destacou ainda, que deve-se levar em consideração que Maffeis foi eleito pelo voto da maioria da população, prerrogativa constitucionalmente garantida pela Constituição Federal. “A retirada de um representante eleito pelo povo é medida excepcional que deve estar lastreada em requisitos firmes, idôneos e suficientes para que seja viável a ruptura do que foi decidido em eleição”.

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