O caso confirmado de morte por botulismo de uma jovem de 25 anos em Araçatuba (SP), chama a atenção para os cuidados para se prevenir a doença. Pensando nisso, o Hojemais Araçatuba convidou o médico infectologista Fábio Bombarda, para explicar sobre o que é a doença, como ela atinge o organismo e como preveni-la.
Um fato que chama atenção pelo que foi informado pelo especialista, é que o botulismo não é causado exclusivamente pela ingestão de alimentos contaminados. Além do “botulismo alimentar”, que é quando se ingerie a própria toxina em alimentos contaminados, há também o “botulismo intestinal”, mais comum em crianças, onde não há ingestão direta da toxina pronta.
O médico explica que essa é doença descrita há mais de 200 anos, identificada inicialmente em pessoas que comeram salsichas. “Tanto que botulus é salsicha em latim. Então, o nome vem do veneno da salsicha”, explica.
Bombarda informa que a doença na forma alimentar normalmente está associada a produtos embutidos, conservas e produtos caseiros, que não têm uma conservação adequada. Por isso, que com a industrialização das conservas, surgiu a necessidade do controle de vigilância da produção de alimentos, com padronização.
“O botulismo é o seguinte, nós temos uma bactéria que está presente no ambiente, ela se prolifera na ausência de oxigênio e, ao se proliferar, passa a produzir uma toxina, que é a defesa dela. Só que essa toxina botulínica é extremamente venenosa para humanos e qualquer animal vivo”, explica.
Botulismo intestinal
Essa forma é mais frequente em crianças, geralmente menores de 1 ano, que ingerem esporos do Clostridium botulinum - que podem estar presentes em alimentos, poeira, solo ou mel contaminado.
“No intestino imaturo do bebê, esses esporos conseguem germinar e produzir toxina ali mesmo, dentro do trato gastrointestinal. A toxina é então absorvida, levando ao quadro clínico idêntico ao botulismo alimentar”, explica.
Segundo o médico, este fenômeno também pode ocorrer em adultos por disbiose intestinal; em imunossuprimidos, pelo uso de antibióticos; ou em pessoas com doenças inflamatórias intestinais - nesse caso, chamado de “botulismo intestinal do adulto”. “Ou seja, não há uma contaminação direta por um alimento que contenha a toxina, mas sim por esporos que ao longo de muitos dias passam a desenvolver a bactéria, que assim produz a toxina", diz.
Ainda de acordo com o especialista, infelizmente não há exames que possam comprovar se a origem da doença é alimentar ou intestinal, esta última, mais rara.
Aplicação do botox
Além do botulismo alimentar, causado quando a pessoa ingere o alimento que tem a toxina, e do botulismo intestinal, que pode causar uma disbiose, existe ainda a contaminação por meio da aplicação da toxina botulínica. “Há casos descritos no Brasil de botulismo pela aplicação do popular botox. O uso dele traz um alerta para o desenvolvimento do botulismo”, explica Bombarda.
Aquecer alimentos antes do consumo pode evitar o botulismo
O médico infectologista Fábio Bombarda explica que ao aquecer um alimento contaminado, por pelo menos 85 ºC, pelo período de cinco a dez minutos, imediatamente antes do consumo, é possível inativar tanto a bactéria quanto a toxina botulínica que eventualmente estiver no alimento contaminado. “O cozimento, a fritura, o grelhado, enfim, os produtos que são submetidos à temperatura imediatamente antes do consumo, têm essa enzima inativada”, informa.
Ele alerta ainda para a importância de as pessoas terem cuidado ao comprar produtos em conserva. A recomendação é sempre verificar se possuem o selo do Ministério da Agricultura; se as latas estão conservadas, se não estão estufadas, amassadas ou com lacres rompidos; além de observar a validade dos produtos e evitar, inclusive, comprar produtos muito próximos da data de validade.
“É muito importante ainda respeitar as recomendações do fabricante, quando informa o determinado prazo para consumo após aberto, sob refrigeração. Não é porque vai estragar, é porque depois de três dias, bactérias podem se proliferar”, alerta, reforçando que é comum as pessoas abrirem as embalagens e deixarem os produtos por vários dias abertos, na geladeira.
Por fim, Bombarda recomenda que se evite consumir produtos sem identificação de procedência, principalmente adquiridos de ambulantes, incluindo doces, salgados e alimentos que levam maionese ou conservas de produção caseira. “Isso traz muito risco, pois é nesse momento que vai acontecer a contaminação”, alerta.
Normalmente os casos de botulismo ocorrem em surtos
Outro fato que chama a atenção sobre o botulismo, segundo o médico infectologista Fábio Bombarda, é que ele geralmente ocorre em surtos, onde grupos de pessoas acabam se contaminando, porque a toxina botulínica é um veneno, de acordo com ele.
"Casos isolados também podem acontecer, mas geralmente é difícil fazer o vínculo de origem, pois muitas coisas que a gente consome ao longo do dia, em casa ou fora, podem estar associadas”, explica.
Ele reforça ainda que há o próprio botulismo intestinal, causado por problema relacionado à flora intestinal, consumo de antibióticos, doenças inflamatórias intestinais e principalmente nos casos das crianças, que possuem uma fragilidade da microbiota intestinal, e algumas bactérias acabam se proliferando. “Independentemente de intoxicação, as pessoas passam a produzir no intestino essa toxina”, alerta.
Sintomas
Bombarda explica que os sintomas podem ser vagos no início, o que dificulta o diagnóstico. A doença pode causar perda de força muscular, da parte de cima do corpo para baixo, mas existem várias outras causas de perda de força muscular, incluindo a síndrome de Guillain-Barré, doenças autoimunes, e meningite.
“Muitas causas podem trazer sintomas neurológicos, mas especificamente no caso do botulismo, ocorre uma perda da força muscular de cima pra baixo, dificuldade de abrir as pálpebras, dificuldade visual e de deglutir. Vários sintomas podem acontecer, mas não são tão específicos, não é simples fazer um diagnóstico inicial”, comenta.
Rapidez
Porém, ele informa que diante do diagnóstico, quanto mais precoce se inicia o tratamento, por meio de soro que irá inativar as toxinas que estão circulantes, melhor o prognóstico. “É uma doença que traz muita mortalidade”, alerta.
Como ela está muito associada a consumo de produtos in natura, a conservas e a embutidos, o médico reforça a importância do aquecimento do produto imediatamente antes do consumo, para inativar a bactéria.
Bombarda ressalta a importância da prevenção, pois além do alto índice de mortalidade, o que depende do tempo em que se inicia o tratamento, o botulismo pode ainda assim, deixar sequelas e, mesmo quando tudo dá certo, o tratamento pode perdurar mais de um ano.