Polícia

Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo quer ouvir hacker de Araçatuba

A mais nova versão de Patrick, que permanece na Sérvia, é que o ex-ministro Gilberto Kassab o teria contratado para espionar o ex-presidente Jair Bolsonaro e Adélio Bispo, preso por tê-lo esfaqueado em 2018
Lázaro Jr.
29/08/2024 às 19h20
Guilherme Derrite informou que a Corregedoria da Polícia Civil deve convidar Patrick para ser ouvido (Foto: Reprodução) Guilherme Derrite informou que a Corregedoria da Polícia Civil deve convidar Patrick para ser ouvido (Foto: Reprodução)

O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, informou que a Corregedoria da Polícia Civil da Capital irá convidar o hacker Patrick Cesar da Silva Brito, de Araçatuba, para prestar depoimento em uma apuração preliminar que será acompanhada pessoalmente por ele.

 

A informação foi divulgada pelo próprio secretário, em entrevista à Rádio Auriverde Brasil, de Bauru, na quarta-feira (28). Um dia antes, a mesma rádio havia entrevistado Patrick, que afirmou em 2018 que teria sido contratado pelo ex-ministro Gilberto Kassab para "fazer um levantamento" da vida do então candidato a presidente Jair Bolsonaro e também de Adelio Bispo.

 

O mesmo Adelio Bispo foi preso naquele ano, após desferir uma facada em Bolsonaro, quando ele estava em campanha em Juiz de Fora. A Polícia Federal já afirmou em inquérito que o autor da facada agiu sozinho. O processo criminal que o condenou, o considerou inimputável por transtorno mental e em fevereiro, a Justiça determinou a transferência do condenado para um estabelecimento psiquiátrico.

 

Interferência

 

Na entrevista concedida à rádio de Bauru, Patrick alega que as investigações das denúncias feitas por ele não teria andamento justamente por interferência de Kassab, que atualmente é secretário de Governo e Relações Institucionais no governo Tarcísio de Freitas (Republicanos).

 

Ao anunciar a instauração da apuração preliminar da Corregedoria da Polícia Civil durante pronunciamento para o mesmo jornalista que entrevistou Patrick, Derrite afirmou que não há interferência política na SSP.

 

Ele declarou que não tem relação política nenhuma com Kassab e jamais permitiria que outro secretário interferisse politicamente na Pasta. "Ainda mais em uma investigação de extrema relevância como essa apontada pelo Patrick Brito. Eu sou o maior interessado em descobrir tudo o que ele fala. Então, nós vamos dar uma oportunidade de ouro para que ele possa trazer elementos probatórios que ele menciona em outras entrevistas", disse.

 

Ainda segundo o secretário, será feito o convite para o hacker ser ouvido por meio de videoconferência e com base nos documentos que ele apresentar, o que for de competência da Polícia Civil de São Paulo será encaminhado ao Ministério Público e o Poder Judiciário. O que for de responsabilidade federal, será encaminhado à Polícia Federal. "Se ele realmente trouxer elementos probatórios, essa é a grande novidade dessa apuraçao preliminar", disse.

 

Araçatuba e Bauru

 

Apesar de o pronunciamento ter sido feito um dia após a entrevista concedida por Patrick à rádio, Derrite afirmou que a apuração preliminar foi instaurada com base principalmente em ofício entregue a ele pelo vereador de Bauru, Eduardo Borgo (Novo), durante visita dele à cidade para a inauguração de uma delegacia.

 

Borgo é membro de uma CEI (Comissão Especial de Inquérito) instaurada pela Câmara de Bauru para investigar a invasão de dispositivos de uma vereadora e de um jornalista na cidade.

 

Confessou

 

Em depoimento prestado a essa mesma CEI no final de dezembro do ano passado, dias após deixar a prisão na Sérvia, Patrick confessou ter hackeado os dispositivos da parlamentar e também do jornalista.

 

Na ocasião, ele afirmou que em um ano havia hackeado mais de 300 pessoas, inclusive Bolsonaro, quando ele ainda era deputado federal, em 2018, e depois em 2020, quando já era presidente.

 

O hacker disse ainda que teria vazado o celular do ex-presidente em uma rede social, mas em nenhum momento citou qualquer relação da invasão dos dispositivos de Bolsonaro com Kassab e nem citou Adelio Bispo.

 

Ofício

 

No ofício apresentado ao secretário, o vereador de Bauru questiona a demora da Polícia Civil de Bauru em instaurar inquérito para investigar os supostos crimes praticados por Patrick naquela cidade, já que eles teriam sido praticados em 2022 e a investigação teria tido início em 2024.

 

Quando o caso em Bauru tornou-se público, no segundo semestre do ano passado, a reportagem encaminhou e-mail à assessoria de imprensa do MP-SP (Ministério Público de São Paulo). O órgão informou que havia recebido a representação no dia 30 de outubro e a denúncia seria analisada pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado).

 

Já no final de novembro, a imprensa de Bauru divulgou que os promotores de Justiça haviam encaminhado o caso ao MPF (Ministério Público Federal), pois os crimes teriam sido cometidos por Patrick quando ele já estava na Sérvia.

 

Questionamentos

 

O vereador autor do ofício também questiona a investigação feita pela Corregedoria da Polícia Civil de Araçatuba, que apontou a participação de um policial civil em crimes praticados por Patrick, que foi denunciado e é réu em processo de extorsão e invasão de dispositivo do prefeito Dilador Borges (PSDB) e da primeira-dama Deomerce Damasceno.

 

Ao anunciar a instauração da apuração preliminar pela Corregedoria da Polícia Civil da Capital, Derrite reforçou que esse policial investigado foi afastado das funções. Ele informou ainda que o delegado citado por Patrick em denúncias feitas por ele também foi transferido e irá realizar outra função enquanto durar o procedimento.

 

"Isso não é uma punição ao delegado de polícia, que fique claro e registrado aqui, não é uma punição, mas é para garantir também a lisura dos procedimentos que devem ser apurados nesse âmbito", afirmou.

 

Por fim, o secretário de Segurança Pública argumentou que para ele não interessa se Patrick é um criminoso, pois o que quer saber é se ele tem como comprovar as acusações que vem fazendo ao longo do tempo. "Até porque o nosso objetivo é colocar um ponto final nessa história de forma transparente", declarou.

 

Notas

 

A reportagem procurou a assessoria de imprensa da SSP, que informou que a mudança de função do delegado de Araçatuba ocorreu em razão de uma readequação administrativa, sem qualquer caráter punitivo. "O delegado foi realocado funcionalmente, cessando a gratificação recebida, sem suspensão de sua devida remuneração", informa a nota.

 

A assessoria de Kassab também foi procurada diante das acusações de Patrick e negou qualquer relação do secretário com o hacker. "Gilberto Kassab não conhece esse sujeito e nega peremptoriamente os fatos imputados. Kassab irá tomar as medidas legais cabíveis, pese o fato de seu caluniador ser um foragido da Polícia e da Justiça brasileiras".

 

Patrick

 

Após a publicação da matéria, Patrick enviou mensagem para a reportagem por meio de um número de telefone do exterior, afirmando que provará nos autos, assim como tem feito em todos os procedimentos.

 

A reportagem procurou o advogado Daniel Madeira, que o representa em algumas ações, e ele confirmou que essa é a manifestação de Patrick.

 

Hacker já foi ouvido pela Polícia Civil de Araçatuba

 

Apesar de o secretário de Segurança Pública Guilherme Derrite ter afirmado em pronunciamento à Rádio Auriverde de Bauru que a apuração preliminar vai dar oportunidade para o hacker Patrick Cesar da Silva Brito falar, o que não teria sido oferecido ainda pela Polícia Civil, segundo ele, Patrick já foi sim ouvido pela DIG/Deic (Delegacia de Investigações Gerais da Divisão Especializada de Investigações Criminais) de Araçatuba.

 

Ele prestou depoimento no dia 4 de janeiro deste ano, em inquérito que investiga os crimes de coação no curso processo; injúria, calúnia e difamação; ameaça; falsidade documental; e exploração de prestígio.

 

Há ainda um segundo inquérito que apura possível crime de invasão de dispositivos, o qual foi encaminhado à Corregedoria da Polícia Civil de Araçatuba, devido a indícios de possível participação de um policial civil. Os dois processos tramitam na 1ª Vara Criminal de Araçatuba e estão em segredo de Justiça.

 

Preso

 

Patrick também haia sido ouvido em outros dois processos. Ele é acusado de invadir os dispositivos de uma advogada e já foi denunciado e é réu em processo que apura os crimes de invasão de dispositivo e extorsão contra o prefeito e a primeira-dama de Araçatuba.

 

Nesse segundo processo, a Justiça de Araçatuba expediu o mandado de prisão preventiva contra ele, o qual foi cumprido pela Interpol em 23 de dezembro de 2022, na Sérvia.

 

O hacker permaneceu preso até 22 de dezembro de 2023, quando teve direito à liberdade, já que pela lei local, nenhuma pessoa pode ficar encarcerada por mais de um ano por crime que tenha cometido em outro país.

 

Segundo o que foi apurado pela reportagem, a Justiça de Belgrado, capital da Sérvia, já decidiu favorável à extradição de Patrick, que entrou com pedido de asilo naquele país. Porém, ele recorreu da decisão.

 

Sem resposta

 

A reportagem já procurou o Ministério da Justiça e Segurança Pública pedindo informações sobre o andamento do pedido de extradição de Patrick, mas a resposta é que o órgão não comenta casos específicos em andamento, pois correm em sigilo.

 

No dia 14 de agosto a reportagem também procurou a assessoria de imprensa da Polícia Federal, pois um blog de Bauru publicou que o hacker de Araçatuba teria sido ouvido pela Polícia Federal, em Brasília.

 

Em nota, na ocasião a PF informou que não se manifesta sobre eventuais tomadas de depoimentos ou investigações em andamento.

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