Por Graciela Franco
A minissérie Adolescência trouxe à tona, a necessidade de inúmeras discussões sobre como estamos cuidando de nossos adolescentes. Muitas análises foram realizadas, sobre muitos pontos e vieses, mas talvez uma das unanimidades nas discussões foi a influência da internet na vida de nossas crianças e adolescentes e o quanto isso tem sido problemático.
É importante lembrarmos que vivemos em uma sociedade machista e, com isso, quero dizer que o ódio pelas mulheres e meninas não nasceu com a internet. Mulheres e meninas são vítimas de violência desde que ‘o mundo é mundo’. É importante dizer isso, pois não é a internet a nossa algoz, mas o machismo.
Dito isso, quero evidenciar aqui o quanto a internet passou a ser mais um recurso de disseminação de ódio às mulheres, com o plus de possibilitar a interação e criação de grupos voltados a difundi-lo.
Os famosos algoritmos vão ditando o que meninos (e meninas) consomem na internet, pois basta colocar como área de interesse algo como ‘coisas para meninos’, que vão chover vídeos com violência, pornografia e como ‘coisas de meninas’, vídeos com apelo a beleza, magreza, e aí nossos meninos e meninas vão sendo levados cada vez mais a avaliar como natural a violência, o consumo e a beleza e por isso buscá-los como padrão de masculinidade e feminilidade.
E isso é muito problemático.
Há alguns meses escrevi que a violência urbana ou mesmo a sensação de violência, fez com que os adultos não permitissem mais o acesso à rua de forma livre para crianças e adolescentes, entendendo que a casa, o emparedamento era sinônimo de segurança, sem levar em conta os riscos que estão agora não só na parede da sala, mas nos quartos e nas mãos de seus filhos e filhas.
Infelizmente a cada dia temos mais e mais comprovações de como esse ‘emparedamento conectado’ tem trazido riscos evidentes. Essa semana os jornais noticiaram a morte de uma criança, que ao que tudo indica se deu a partir de um desafio da internet, o cyberbullying é uma realidade; e é importante lembrarmos que, como na série Adolescência, os riscos e a violência das redes, escoam para a vida real, como se a vida online ditasse o comportamento fora dela.
Vamos pensar: Nas redes sociais você pode seguir só quem pensa como você, pode bloquear, pode até brigar e depois cancelar a pessoa, mas e na realidade? E no dia a dia da escola? Da vida em família, como se faz?
Acho que um dos ingredientes mais prejudiciais das redes sociais, da vida online é a não possibilidade, daquilo que no judiciário, a gente chama de contraditório, ou seja, das interações e vivências com quem pensa diferente de nós, pois é isso que nos ensina a ceder, a compartilhar, a planejar e a respeitar o outro, que nos faz ser humanos de verdade.
Então, para mim, a minissérie traz esse recado: Interaja com suas crianças e adolescentes! Saiba o que eles fazem, o que pensam, permitam que possam expor suas ideias, suas angústias.
E isso é um grande desafio, principalmente porque eu, e creio que a maior parte dos leitores desta coluna, não sou da geração da internet, nasci na década de 1980, na qual, como eu disse o machismo já existia há milênios, mas que as interações ocorriam no “tête-à-tête”, então as possibilidades de luta, confronto e pacificação também ocorriam na realidade das relações.
Ninguém se imagina pai e mãe do Jamie Miller (o adolescente principal da minissérie) e nenhum pai e mãe quer que aconteça com suas filhas o que aconteceu com a Katie (adolescente morta na série). Então, cabe a nós, os adultos da relação, assumirmos nosso papel neste longa metragem chamada paternidade e maternidade. Como?
Não tenho as respostas e creio que ninguém, de fato, as tenha; mas me atrevo a dizer que tenho algumas pistas, pois creio que isso passe pelo estabelecimento de novas relações, do entendimento da criança e do adolescente como sujeito de direito, mas que precisa de um adulto responsivo, que lhe imponha limites, que conduza a educação de forma gentil e firme.
O que na prática pode significar: limitar o horário de uso de celular e redes sociais; utilizar controle parental no acesso à internet; ter acesso aos aparelhos dos adolescentes, aos grupos online dos quais os filhos participam; conhecer os amigos e amigas dos filhos, assim como seus pais, incluir seus filhos nos acontecimentos da família, da casa, isso inclui, cozinhar junto, planejar passeios juntos. Que deixem vir os conflitos, são eles que vão nos conduzir, possibilitando negociação, escuta, de contraponto.
Talvez isso não seja o suficiente, pois a proteção integral de crianças e adolescentes é também responsabilidade da sociedade e do Estado, que neste caso, passa pela regulação da internet/ das redes sociais, mas creio que a ausência destas medidas não justifica a nossa ausência enquanto família.
Graciela Franco
Mãe da Mariah de 07 anos, Educadora Parental, Pedagoga e Assistente Social
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