Por Fil Bosco
A caneta nas mãos erradas, pode ser tão perigosa quanto uma arma. Enquanto a violência da arma choca e assusta pela força bruta, a improbidade administrativa opera no silêncio dos gabinetes, com tinta e papel, minando direitos, desviando recursos e comprometendo o futuro de milhões. Cada assinatura feita em nome do interesse próprio, cada conchavo firmado nas sombras do poder, é um disparo contra a dignidade da população. A corrupção administrativa não faz barulho, mas seus efeitos são devastadores: hospitais sem insumos, escolas abandonadas, obras inacabadas.
Para o Cangaceiro da Atualidade, a arma convencional ficou ultrapassada, foi sepultada na época do cangaço, com Lampião e seu bando. A nova versão se transveste de bom samaritano, como uma pessoa solidária, compassiva e disposta a ajudar o próximo. Porém, por interesses escusos, proporciona principalmente a desigualdade social. Para ele, a morte em uma fila de um hospital serve apenas para estabelecer números estatísticos.
A existência do Lampião da Atualidade. Entre os anos de 1995 a 2024, ocorreram 28.216 condenações judiciais (Fonte: CARVALHO, Júnior. Poderes Reduzidos. Revista eletrônica - Consultor Jurídico - ConJur, de 18.02.2025). Por tipo de improbidade:
Dano ao erário (36%);
Atentado contra os princípios da administração pública (34%);
Responsabilizações por enriquecimento ilícito (10%); e
Outras condutas ilícitas (20%).
Detalhes:
Dano ao erário: qualquer prejuízo causado aos cofres públicos, resultante de ação ou omissão que gere perda patrimonial, desvio, desperdício, ou uso indevido de recursos públicos.
Atentado contra os princípios da administração pública: ocorre quando agentes públicos desrespeitam os princípios que orientam a administração pública, como legalidade, publicidade e eficiência. Esse tipo de conduta compromete a transparência, a ética e a boa gestão dos recursos públicos.
Enriquecimento ilícito: ocorre quando um agente público obtém vantagem patrimonial indevida em razão do cargo, como receber propina, desviar recursos ou usar bens públicos em benefício próprio.
A maioria das condenações mencionadas foram fundamentadas pela LIA - Lei de Improbidade Administrativa, 8.429/1992, alterada pela lei 14.230/2021, a qual apresenta significativas mudanças, tais como: obrigatória comprovação de dolo e eliminou o enquadramento culposo, embora possa gerar outras consequências (administrativas, cíveis, etc.). Entrou em vigor em outubro de 2021.
Após a reforma da Lei de Improbidade Administrativa (LIA - 14.230/2021), observou-se uma queda significativa de novas ações por improbidade administrativa.
Mas, para retornarmos no tempo, em busca do Lampião de Outrora, utilizamos do trabalho realizado pelo historiador brasileiro, Guerhansberger Tayllow Augusto Sarmento, especializado no estudo do cangaço e das narrativas do Nordeste. Graduado e Mestre em História.
O cangaço ocorreu fortemente nas primeiras décadas do século XX, no Nordeste do Brasil. Foi uma época de muita desigualdade social, extrema pobreza, seca constante e ausência do governo na região. Os cangaceiros eram grupos armados que percorriam o sertão praticando saques e cobrando “proteção” de proprietários rurais. Eram vistos como fora da lei, mas uma determinada parte da população os via como justiceiros que enfrentavam os coroneis ricos e o poder opressor.
O mais famoso deles foi Virgulino Ferreira da Silva (1897-1938), o Lampião, conhecido como o “Rei do Cangaço”. Nasceu em Serra Talhada-PE. Foi líder de um dos bandos mais organizados e temidos da época - de 1922 a 1938.
Com a morte de seu pai, assassinado por forças policiais em 1921, durante um conflito de terras, despertou em Lampião um desejo de vingança contra autoridades e representantes do Estado. Além disso, buscava reconhecimento, poder e respeito.
Nesse ano, aderiu ao bando de Sinhô Pereira, um dos cangaceiros de maior expressão. Em 1922, Sinhô Pereira abandonou o cangaço, e Lampião assumiu a liderança do grupo. Então, passou a praticar ataques contra propriedades e cidades à procura de riqueza.
A morte de Lampião, de sua esposa Maria Bonita e de outros integrantes do grupo ocorreu em 1938 na fazenda Angicos, localizada no Estado de Sergipe, por tropas volantes.
O Lampião de Outrora saqueava, roubava, assassinava e entre outras práticas, utilizando-se de armas convencionais. O Lampião da Atualidade pratica o mesmo com o patrimônio público, contudo utilizando estratégias refinadas, com a caneta, os conchavos e a influência, e sem o confronto direto da antiguidade, acreditando que ficarão impunes.
Então não se engane: a verdadeira bala é a verba desviada. Enquanto a arma assusta, a caneta corrompida mata em silêncio, tira leito, apaga a lousa escolar e enche bolsos sujos. A improbidade é crime com gravata e gabinete. Pergunto, quantas espécies de Lampião, Maria Bonita e Sinhô Pereira existem na atualidade?
O meu apreço e admiração aos combatentes dos Lampiões da Atualidade, os nossos Modernos Volantes, o TCU, TCEs, TCMs, CGU, MPF, PF, entre outros, que realizam trabalhos de respeito à proteção ao patrimônio público.
Fil Bosco
Contador, pós-graduado e MBA em Gestão Empresarial. Pós-graduando em Gestão Pública. Bancário por 39 anos, sendo 30 em auditoria. Agropecuarista. Concorreu ao pleito na eleição para prefeito de Braúna-SP.
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