Por José Márcio Mantello
Embora a Lei 14.994/24, tenha entrado em vigência desde 10/10/24, com certeza, há muitos que ainda não sabem da sua existência e muito menos dos desdobramentos que ela trouxe consigo.
Por isso, nosso objetivo nas próximas semanas, nesse espaço, é oferecer uma análise clara e objetiva sobre as principais mudanças trazidas pela Lei nº 14.994, de 2024, e seu impacto prático no ordenamento jurídico.
As reflexões e conteúdos aqui apresentados são um ponto de partida para que operadores do direito e estudiosos possam se aprofundar no combate à violência contra a mulher e na proteção de seus direitos.
Diante desse cenário, imagine um contexto em que a proteção às mulheres contra a violência ganha um capítulo novo e decisivo. O feminicídio, um dos crimes mais brutais que afetam nossa sociedade, agora é tratado como crime independente, autônomo, com penas mais severas e novas medidas específicas para prevenir e coibir a violência. Ele figura agora no artigo 121-A do Código Penal.
A recente sanção da Lei nº 14.994, de 9 de outubro de 2024, promete transformar a maneira como a justiça criminal aborda os crimes cometidos contra as mulheres, buscando não apenas punir, mas também prevenir.
Mas será que o aumento das penas e o endurecimento do tratamento penal são, de fato, uma solução para um problema tão profundo? Embora a nova lei represente um avanço, é importante questionar se a mera aplicação de penas mais rigorosas será suficiente para frear a violência de gênero. Afinal, a questão vai muito além da proteção em si: envolve também fatores culturais, sociais e estruturais que alimentam essa violência há décadas.
Por um lado, o aumento das penas pode ser visto como um sinal claro de que o Estado não tolera a violência contra a mulher. No entanto, é preciso questionar se o problema pode ser resolvido apenas com as leis mais duras.
É sabido que, em relação a outros crimes, o encarceramento em massa e o agravamento das penas apresentam resultados limitados no combate à criminalidade em geral. Isso também se aplicaria ao feminicídio? Ou precisaríamos de mais investimento em políticas públicas de prevenção, educação e apoio às vítimas?
Essas questões abrem caminho para um debate que precisa ser feito de maneira honesta e direta: estamos lidando com a raiz do problema ou apenas reforçando a resposta punitiva do sistema?
Ao longo deste tema, examinaremos as mudanças trazidas pela nova lei e refletiremos sobre seus impactos, tanto na teoria quanto na prática.
A Lei nº 14.994, de 2024, não trouxe apenas a tipificação autônoma do feminicídio, mas também uma série de mudanças que impactaram diretamente o Código Penal, o Código de Processo Penal, a Lei de Execução Penal, a Lei das Contravenções Penais e a Lei Maria da Penha.
A criação de um crime independente para o feminicídio é um marco que vai além da simples categorização de homicídios. Ela reforça a necessidade de considerar a violência contra a mulher como uma característica que exige uma resposta jurídica diferenciada.
Mas por que essas mudanças são tão relevantes? Creio que para advogados, promotores e juízes, entenderem o feminicídio como crime independente, significa abordar cada caso com um olhar atento às particularidades envolvidas.
Não se trata apenas de julgar mais um crime violento, mas de considerar as situações que tornam esses atos ainda mais graves (a violência doméstica, o menosprezo à condição da mulher, a discriminação).
Essa nova abordagem exige que o sistema de justiça seja adequado, não apenas nas penas, mas também nas formas de prevenir e coibir esse tipo de crime.
Além disso, a lei também traz mudanças substanciais na execução penal e na forma como o Estado lida com a reincidência e a prevenção de novas violências.
Por exemplo, ao ver a negação de benefícios como visitas íntimas a condenados por crimes contra a mulher e ao implementar o monitoramento eletrônico para quem obtém saídas temporárias, o legislador busca não só punir, mas também evitar a perpetuação do ciclo de violência.
O que se espera é que, com essa nova legislação, o Brasil dê um passo importante na proteção das mulheres. No entanto, reiteramos a reflexão: serão essas medidas suficientes para transformar a realidade ou serão apenas paliativos?
A aplicação dessas mudanças não depende apenas da norma escrita, mas também de como elas serão resolvidas na prática. E isso nos leva a um ponto crucial: o impacto dessas alterações no dia a dia da justiça criminal.
No próximo artigo, vamos mergulhar nas mudanças legislativas trazidas por essa lei e entender, em detalhes, como elas afetam os diferentes dispositivos do Código Penal, da Lei Maria da Penha e de outras leis correlatas.
José Márcio Mantello é advogado criminalista na comarca de Araçatuba e Teólogo
Graduado em Direito pela UNITOLEDO; Pós-Graduação em Docência do Ensino Técnico e Superior pela UNITOLEDO; Pós-Graduação em Prática Penal Avançada pelo DAMÁSIO EDUCACIONAL; Especialização em Execução Penal pelo IDPB – Rio de Janeiro
Atuação no Tribunal do Júri
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